Entrevista com os Indicados GPCB 2020
Com o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro se aproximando, aproveitamos para conversar com os Profissionais de Pós-Produção de Som responsáveis pela edição, supervisão e mixagem dos filmes indicados na categoria “Melhor Som”. Agradecemos desde já a generosa contribuição dos profissionais que cederam esse tempo pra responder nossas perguntas. Boa sorte a todos! Os filmes concorrendo em 2020 são: A Vida Invisível, Bacurau, Kardec, Turma da Mônica – Laços e Simonal.
Pelo filme A Vida Invisivel fala Waldir Xavier, Supervisor responsável pelo Desenho de som.
Neste ano nós temos 3 filmes “de época” concorrendo. Do ponto de vista criativo, quais os desafios que esse tipo de filme apresenta em relação aos filmes com estórias contemporâneas?
WX: O maior desafio de um filme “de época” é sempre o de fugir, eliminar ou atenuar os elementos sonoros contemporâneos, tanto nos sons oriundos da filmagem quanto nos elementos adicionados na pós-produção. Mas a maior questão do “A Vida Invisível” não era tanto pautada na reconstituição do filme “de época” mas principalmente no tratamento não realista que a direção buscava, por se tratar de um melodrama. Esta busca abriu um leque muito grande de possibilidades para a criação do universo sonoro do filme, muito ajudado pela presença da música.
Você trabalha há muitos anos com o Karin. Como se dá a construção de uma relação tão duradoura com um diretor? Trabalhar com alguém que você já conhece, ajuda no processo do filme?
WX: Considero a minha relação com o Karim Aïnouz uma verdadeira parceria pois trabalhamos juntos desde o seu primeiro longa, “Madame Satã”, e já fizemos sete trabalhos juntos. Vamos aprofundando nossa colaboração, nosso diálogo e confiança a cada filme. Já temos referências e um vocabulário próprio que vai aumentando a cada projeto. Referências estas que são normalmente redescobertas e modificadas pois os pedidos mais constantes da direção são os de surpreender e inovar.
A meu ver esta experiência ajuda muito o processo, sobretudo por haver muita confiança.
Quais outros profissionais colaboraram com você na edição de som do filme?
WX: Rodrigo Sacic – edição do som direto; Fernando Aranha – edição de efeitos; Bernardo Adeodato – edição e pré-mixagem; Ricardo Alvim e Gabriel Barcellos – assistente de edição; Maurício Castañeda – Ruídos de Sala
Qual ou quais cenas você mais gosta?
WX: Gosto muito das cenas musicais, principalmente da fluidez como o universo sonoro cede espaço para a entrada da música e, ao final, naturalmente retorna-se ao ambiente realista. Para as cenas em que Eurídice toca piano, o piano foi gravado em estúdio, após a montagem final, em um trabalho minucioso de sincronismo e interpretação do Guilherme e Gustavo Barbato. A cena em que Eurídice passa a prova no Conservatório de música é a minha predileta pois é um momento de felicidade e verdadeira plenitude da personagem conduzida pela música.
E dentre as cenas de trilha, a minha cena favorita é a da confeitaria Colombo, em parte vista através de um aquário,
quando as irmãs quase se encontram. Ela traduz à perfeição o estilo do melodrama que buscava o Karim. A grandiosidade da música complementando a estética do trabalho de fotografia.
E, finalmente, a cena em que a câmera fecha um close na emocionada Fernanda Montenegro. Neste momento pedimos ao mixador que retirasse todo o som do filme, indo para o silêncio total. “Mas é um erro!”, argumentou muito preocupado o mixador. Mantivemos o pedido insistentemente, “não precisamos de som, a emoção nos olhos da nossa Fernanda nos basta.
Como é trabalhar com mixadores de outros países? Você acha que a bagagem cultural do mixador imprime na mix?
WX: Minha experiência profissional é baseada em encontros com profissionais de outros países, visto que me formei na França e trabalhei em filmes de diversas nacionalidade antes mesmo de fazer filmes brasileiros. E de volta ao Brasil, continuei trabalhando em muitas co-produções mixadas na Europa. Com o próprio Karim, já mixamos na França, em Portugal, no Brasil e, nos últimos dois filmes,
na Alemanha. Gosto muito dos encontros e escutas de pessoas de outras culturas. Elas atentam muitas vezes para elementos que nem sempre prestamos tanta atenção e isso é bem interessante.
No caso do “A Vida Invisível”, este olhar estrangeiro era muito bem aceito pelo fato de não estarmos fazendo um filme realista.
A fotógrafa, Hélène Louvart, e o diretor de arte, Rodrigo Martirena, não eram brasileiros, e sim francesa e uruguaio, respectivamente.
Você acompanha mix presencialmente ou remotamente? Quais desafios você encontrou na mixagem deste filme?
WX: Sim, sempre acompanho a mixagem e considero primordial poder realizar esta etapa do trabalho com o diretor, com a atenção e qualidade de escuta que somente se tem no estúdio de mixagem.
O maior desafio da mixagem do “A Vida Invisível” foi sem dúvida reunir tantos sons distintos; elementos de época, som direto, voz off, uma grande quantidade de ambientes e efeitos não naturalistas, música diegética e trilha de uma maneira fluída e orgânica, mas sem ter medo de excessos e de afirmar claramente intenções dramatúrgicas com a mesmo vigor e exuberância trabalhada na imagem.
Um ponto importante na finalização do “Vida” foi o trabalho simultâneo com a marcação de cor. A escuta da mixagem foi determinante para a decisão final do trabalho de imagem. Assim como a projeção da marcação de cor no estúdio de imagem, a Post Republic de Berlim, foi fundamental na reta final de mixagem. A adequação do som com a imagem é a meu ver, sempre, o principal desafio do desenho de som de um filme.
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Pelo filme Bacurau falam o Supervisor e Mixador responsável pelo desenho de som Ricardo Cutz e o Mixador Cyril Holtz.
Bacurau é um filme que navega por gêneros e estilos, é um pouco Western, um pouco distopia Futurista. Por onde começa sua abordagem?
RC: Eu tinha na minha cabeça, desde 2016 quando fizemos Aquarius, a imagem de um passaro com uma boca cheia de dentes afiados, que Kleber havia me mostrado. Eu li o roteiro, mais ou menos um mês antes deles começarem a filmar e tomei um café com Kleber, de passagem pelo Rio e disse pra ele que o roteiro parecia escrito por Steven Spielberg.
Eu tinha na minha cabeça de maneira muito clara como seria a cidade com seus costumes e tecnologias. Por essa pegada Steven Spielberg eu imaginava que a sonoridade e os efeitos sonoros deveriam ser muito precisos e potentes. Eu imaginei que o desenho de som deveria ser conciso, reforçando e realçando os aspectos narrativos do filme a partir da geografia da cidade, suas relações internas e para com os invasores e também a partir da linguagem do gênero, na minha cabeça, mais para o Western.
Quando eles foram filmar no agreste, encontram uma fauna e flora rica e muito viva e portanto para as inflexões do filme foi preciso silenciar e limpar muitas coisas como passáros. Havia muitos pássaros. Nós tínhamos um mote desde o início que era: não fazer nada que soasse industrial. Com isso tínhamos em mente que era preciso sempre procurar soluções e sons que não soassem “prontos”, “clichês” ou “hollywoodianos”, mas ao mesmo tempo procuravamos um acabamento e potência muito ligado a esse tipo de filme.
Em geral, da minha relação prévia com Kleber eu esperava uma precisão grande em relação a função, a presença de cada som. Nada entra por acaso. Nada vai pro surround por acaso. Com Juliano a pegada era um pouco mais afetiva e institiva, mas ambos tinham um domínio muito claro do que desejam passar com cada cena e sequência, mesmo que esse domínio viesse após algumas horas de debates e tentativas no balanço dos elementos (risos).
Você normalmente é o Supervisor de edição e mixador dos filmes que você assina. Neste filme você co-mixou com Cyril Holtz. Como foi isso e além de você, que outros profissionais colaboraram na edição de som de forma criativa?
RC: No 106db somos uma equipe que trabalha junta desde 2015. Victor Quintanilha é o editor de diálogos. É ele que limpa, troca palavras, sílabas, pré-seleciona dublagens, busca takes alternativos e tudo mais. Eu depois faço um pente fino com ele, muitas vezes com uma abordagem mais de mixagem e decido as dublagens com ele.
Na edição de efeitos tem o Matheus Miguens que trabalha muito próximo comigo. Ele geralmente começar fazendo o trabalho braçal, do tipo viu ouviu. A medida que ele se aprofunda no filme, começa a trazer idéias e soluções para cenas, sequências, às vezes traz sons específicos que eu acabo usando no design de alguma cena. Nós batemos bola durante todo o processo, até o fim da mix.
No foley eu tenho o Pedro Coelho e o Rafael Faustino. Pedro é nosso artista de foley. Ele costuma ter uma pegada bem narrativa e neste filme especificamente, o trabalho dos passos foi um pouco mais delicado, pois 90% do filme se passa na terra, então fizemos bastante testes para achar a “granulação”, a textura ideal. Rafael grava, edita e por ter uma pegada bem forte de sound designer, também contribuiu com idéias e soluções nesse sentido.
Em relação a mixagem, trabalhar com Cyril foi literalmente um passeio em Paris. Um mixador com uma bagagem incrível, extremamente conectado na narrativa e ao mesmo tempo profundamente técnico. Nós tivemos a presença do Kleber e do Juliano durante todo o tempo e nunca nos esquivamos de um debate ou de tentar algo que os diretores buscavam. Como acontece geralmente nesses casos, Cyril cuidou dos Diálogos e Música e eu mixava Efeitos, ambientes e foley.
Qual ou quais cenas você mais gosta?
RC: Eu particularmente gosto muito de um trecho que vai da chegada de Flávio e Maciel na fazenda onde a gente vê a caminhonete crivada de bala, até o final da apresentação do personagem do Udo Kier, Michael. A Sequência ao redor da mesa, dos gringos com o pessoal do Sudeste pra mim também é tensa!
Cyril, você tinha um conhecimento prévio da Cinematogragia do Kleber e Juliano?
CH: Claro! “Aquarius” me comoveu em vários sentidos. A forma como o filme traz uma mensagem engajada apelando para os sentidos, as dúvidas, a revolta e a necessidade da gentileza me impactou particularmente. Após ver “Aquarius”, eu disse pra mim mesmo: adoraria trabalhar com o Kleber. Alguns anos depois, cheio de ansiedade, eu não só trabalhei com ele, mas também com o Juliano! Eles formam uma parceria maravilhosa!
Você acredita que o backgroud Cultural impacta na maneira que um filme soa?
CH: Provavelmente…Mas também é uma questão de tradição, no bom sentido da palavra: como o know-how, no caso o de mixagem, é transmitido e modifica profundamente o que eu considero ser uma arte.
Bacurau foi mixado em um estúdio gigantesco, um estúdio que fechou e virou 6 salas menores. Você acha que isso tem algum impacto na maneira que um filme é mixado, soa? Se sim, porque?
CH: Sim, acredito que isso tem um impacto enorme, no sentido em que o objetivo principal de um estúdio de mixagem de cinema é simular as sensações que temos numa sala de cinema real. Se o lugar em que você mixa não se assemelha com o lugar em que o produto será exibido, ele não cumpre seu papel de ser uma ferramenta confiável. Também é um pouco por causa disso que ver um filme em casa nunca vai provocar as mesmas sensações que ver o filme no cinema. Por isso é importante apoiar o Cinema, aquele que é feito para as salas de cinema, e sob a mesma égide, defender as profissões e os estabelecimentos em que os filmes para o cinema são feitos…
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Pelo Filme Kardec falam Bernardo Uzeda e Tomás Alem, Supervisores de Edição reponsáveis pelo Desenho de Som.
Neste ano nós temos 3 filmes de época concorrendo. Do ponto de vista criativo, quais os desafios que esse tipo de filme apresenta em relação aos filmes com estórias contemporâneas?
BU: Filmes de época sempre apresentam desafios interessantes na pesquisa de sons que sejam, ao mesmo tempo críveis e fiéis ao período retratado, assim como dramáticos e funcionais para a cena.
No caso de Kardec, havia o desafio de criarmos ambientes e vozerios que retratassem a Paris do Século XIX porém dentro de uma narrativa falada em português.
O trabalho de foley também exigiu uma atenção especial do nosso artista Felipe Magalhães, com uma extensa pesquisa de pisos e props de madeira, principalmente na criação dos passos de cenas em interiores. A edição das carruagens também contou com ampla colaboração entre edição de efeitos e foley para rangidos, madeiras, e rodas em superfícies.
TA: Especialmente no foley fizemos testes até chegar numa linguagem convincente, precisávamos sentir o peso dos objetos. Pudemos também aproveitar a abertura que os planos proporcionaram para fazer sentir o ar e o som das salas que são mais amplas, ficamos bem felizes com o resultado.
Vale ressaltar também que existe um trabalho grande neste tipo de filme de efeitos de imagem para a construção dos ambientes exteriores, houve uma colaboração bem próxima nesse sentido. E também um trabalho de limpeza minucioso de qualquer elemento estranho à época, especialmente nos diálogos, onde, em última instância, se recorre ao uso de ADR.
Como vcs dividem o trabalho de edição, supervisão e sound design. Além de vocês dois, existem mais pessoas colaborando na edição de som de forma criativa?
TA: Eu e Bernardo já temos essa parceria há muitos anos, fundamos o estúdio Aura Post, e quase sempre assinamos juntos a supervisão, como foi o caso no Kardec. Nesse trabalho a gente contou com a ajuda de outros 4 editores (Mino editando diálogos, Rodrigo Sacic ambientes, Caio Mazur foley e Carol Fagundes assistência de edição), mais a equipe de foley (Feipe Magalhães artista de foley, Ian técnico de gravação), além da gravação de vozerio com 8 artistas.
Enxergamos nosso trabalho de supervisão como o atendimento e relação com o diretor e produção, a coordenação da equipe e a edição e supervisão em si, que começa pelo spotting no Pro Tools e termina com o trabalho de desenho de som que seria juntar e dar um sentido a todos esses elementos.
A gente começa um projeto fazendo a preparação do material que vem da montagem e logo em seguida faço o spotting no Pro Tools após uma sessão com o diretor. Nesse trabalho tivemos a felicidade de fazer essa sessão com o Wagner na sala de mix com os mixadores, o que é uma enorme vantagem.
Em seguida, iniciamos a edição de diálogos, ambientes, efeitos e gravação do foley com toda a equipe. Após o término da edição de diálogos do Mino eu a reviso para exportar para a mix enquanto o Bernardo prepara a lista de ADR. Ele também começa o trabalho mais avançado em efeitos, fazendo a primeira junção com o foley editado e trabalhando os efeitos mais complexos e hard fx.
Para finalizar e exportar para a mix, tenho a missão de juntar todos os elementos de efeitos e foley, com o diálogo já revisado, inserindo e revisando os ambientes, numa condição melhor para contextualizar tudo o que foi produzido e entender a leitura dos elementos fazendo escolhas e acréscimos necessários. Isso já incluindo vozerio original e ADR e, de preferência, também com a música final, o que nesse projeto tivemos o privilégio de ter à disposição desde o início da edição.
Por fim, eu e Bernardo nos dividimos no acompanhamento da mixagem e as possíveis necessidades de ajustes que naturalmente surgem. É uma troca constante entre nós.
Qual ou quais cenas vocês mais gostam?
BU: Uma cena que se destaca é a abertura do filme, onde precisamos achar um equilíbrio entre o realismo de um evento histórico com certas liberdades e sutilezas sonoras para melhor ilustrar uma sessão espírita liderada por Kardec.
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Pelo filme fala Toco Cerqueira, mixador.
Como foi mixar a 4 mãos?
TC: Foi muito bom mixar com Reily Steele, já nos conhecíamos, mas foi a primeira vez que trabalhamos juntos. O entrosamento foi tão natural que parecia que já trabalhávamos juntos a muito tempo. Eu particulamente adoro trabalhar nesse formato com dois mixadores, apesar de ser pouco usual aqui no Brasil, uma pratica mais da industria de Hollywood. Sempre que posso, e o trabalho permite, busco esse formato.
No caso do “Laços” trabalhamos na mix final com uma Neve DFC 3D e uma Avid D-Control “Linkadas”. Conversamos muito nas pres sobre a estética, testamos texturas de reverbs, eq’s e caminhos possiveis para a mixagem. Entao na mix final estavamos muito entrosados. Geralmente a divisão é dialogo e musica e outro mixer com as atmosferas, foley e efeitos. No caso do “Laços”, por eu ter mixado as musicas antes de começar a mixagem do filme, em alguns momentos trocavámos a condução dos setores.
Existe algum desafio específico na mixagem de um filme infantil de aventura?
TC: O “Laços” tinha muitos cues de musica, basicamente uma na sequencia da outra. Fazer a transiçnao dos climas, e principalmente dos temas, sem que eles fossem notados era um desafio. As cenas que você acha que seriam menos desafiadoras às vezes são as mais difíceis. O Ricardo Reis (editor e sound designer) criou ambientes que podiamos misturar o real com algo que não existe, ludico, que precisava apoiar a narrativa sem chamar a atençnao. Manter a tensão sem ser muito assustador, esse equilibrio foi muito bem cuidado pelo Dani Rezende que nos conduziu em pontos importantes. Assim tinhamos muito cuidado com os LFEs, surrounds, os momentos que podiamos dar susto, onde tinhamos que segurar a mão. A sequencia na floresta de noite que vai para a casa do homem do saco é um exemplo de onde tinhamos que manter a intensão mais densa do homem do saco, mas sem pesar muito pois já vinhamos de uma sequencia longa e densa para as crianças.
E sempre é um desafio pra edição e mixagem dos diálogos um filme com muitas crianças falando, e se sobrepondo grande parte do tempo.
Qual ou quais são as cenas sua cenas preferidas?
A sequência do primeiro plano que da “elado” e Cebolinha foge com o cascão e sequencia do Louco, que deu trabalho pois foi gravado do lado de uma cacheira e ela não aparece, são as que mais gosto. A sequencia da captura do Homem do Saco também é muito divertida de ver e também foi de fazer.
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Pelo filme Simonal fala Renan Deodato e Armando Torres Jr., Editor e Mixador.
Quais os desafios criativos em se mixar um filme de época? A questão musical traz alguma diferença substancial ao trabalho?
RD: Do ponto de vista da mix, tivemos um desafio de trabalhar com imagens de arquivo em uma cena super importante pra narrativa. Temos toda a ascensão do Simonal até chegarmos ao ápice de sua carreira até então que é o show do Maracanãzinho em 69. Se não me engano, essa foi a única cena (Simonal canta e “arrasa” num Maracanãzinho lotado) em que foram usados imagem e som original. Foi feito um trabalho bem minucioso de restauração do som original e acrescentamos alguns sons de vozerio/walla para dar mais força dramática a cena.
AT: Acho que a maior qualidade do “Simonal” é que a música está incorporada dentro do filme: quando chega a música, ela está integrada com o resto dos elementos. Isso foi um desafio grande, por ser um filme de época.
Fizemos muita pesquisa pra acertar, tem cenas em estúdios da época, em shows, em bares… Foi preciso pesquisar as características da música que tocava naqueles lugares. Vi muitas gravações antigas do Wilson Simonal pra ter uma referência pra emular.
Sobre filmes de música, acho que é importante permear a música dentro do filme. Tem que ter dinâmica, tem que colocar o espectador dentro do filme. Em um filme de música, você corre o risco de ter música, música, música e esquecer do resto. A gente tentou criar uma coisa só, mais orgânica. “Simonal” é um filme muito dinâmico de planos de som, o som anda dentro do filme. Pude trabalhar com as vozes, com os Futz, com os ambientes. Nós tínhamos muitos elementos no desenho de som para criar todos esses planos no som do filme.
Vocês podem falar um pouco como é processo para fazer as músicas soarem nos shows ao vivo? As músicas foram regravadas ou são gravações originais do Wilson Simonal? Vocês precisarem fazer muitos up-mixes?
AT: O Max de Castro e o Simoninha foram os responsáveis pelas músicas, eles editaram os fonogramas originais para o filme. Infelizmente não havia a gravação multipista das músicas e apenas uma delas veio com o playback, pelo o que eu me lembro. Então usamos técnicas especiais pra poder isolar algumas coisas, principalmente a voz.
Eu particularmente quis fazer tudo muito recortado, diferenciando plano fechado, plano aberto… No fim, foi uma soma de técnicas, além de upmix. Sem contar que tinham gravações com datas diferentes que eu precisei tratar pra parecer uma coisa só, pra quando o filme tocasse inteiro, o espectador não percebesse tanto essas diferenças.
Os shows ao vivo eram muito complicados de fazer, porque a gente tinha os fonogramas originais e precisava fazer aquilo sair de uma caixa de som. Eu me lembro que para isso usei muito o Indoor, da Audioease. Para o upmix, usei ou o Penteo da PerfectSurround ou o UnWrap daTC eletronics, ia alternando de acordo com o fonograma, mas, além disso, eu tratava o centro de forma diferente e somava com o fonograma stereo. O público dos shows veio da edição de som. Havia material da filmagem, mas não muito, então foram gravados muitos grupos de Walla.
O estilo de mixagem desse filme é diferente do “Elis”, por exemplo. Esse filme tinha muito mais cenas ao vivo. Uma cena de show ao vivo especialmente difícil de fazer foi o show no Maracanãzinho, que foi gravado na época e a gente precisou restaurar. A produção tinha o negativo dessa filmagem em 35mm, o trecho foi telecinado e a gente transcreveu o óptico e restaurou o som. Foi bem difícil de reproduzir a sonoridade e integrar esse show no filme.
Qual ou quais são suas cenas preferidas?
RD: O plano-sequência do “Meu limão, meu limoeiro”. A cena tem quase 4 minutos e uma execução abusrdamente complexa. O trabalho de direção, fotografia e câmera são espetaculares e o som não podia deixar a desejar.
Foram dias de mix pra fazer toda a panorâmica de música e da platéia cantando, o Simonal saindo do palco, passando pelo backstage, pelo hall, chegando na rua e no bar ao lado do teatro. E todo o caminho de volta até o palco com o público cantando super empolgado a música! Foi um desafio enorme mas o resultado foi bem satisfatório!
AT: Vou citar 3: tem uma sequência grande, a da canção “Meu Limão, Meu Limoeiro”, que eu acho a mais legal. Como ele sai do palco, teve uma grande construção de mixagem e de edição de som. Para essa cena foram gravadas muitas coisa de walla e de efeitos em estúdio: as pessoas cantando, as reações, as palmas… E é sempre um desafio juntar tudo porque a sincronia tem que estar o mais próximo possível da música, pra não dar problema de fase quando se faz as reduções para stereo e etc. Essa seqüência levou muito tempo para ficar pronta, pq eram muitos elementos, e é a minha cena favorita.
As cenas no “Bottle’s”, um bar no Beco das Garrafas, no Rio de Janeiro, onde o Miéle e o Ronaldo Bôscoli produziam shows e onde a Elis também cantou, são um bom exemplo do trabalho com o fonograma. Essas cenas foram muito complexas de fazer. Ali usamos o fonograma original como se fosse ao vivo, e a sonoridade dos fonogramas eram muito datadas, então foi preciso achar um equilíbrio para não ter muita diferença de qualidade entre as músicas do filme.
E por fim, o fim do filme também acho bem emocionante, mas não vou contar o fim do filme (risos).
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